Geralmente as vendas consultivas ocorrem em contextos de vendas complexa, em que o vendedor busca auxiliar o comprador no processo de tomada de decisão. Dessa forma, o vendedor não apenas explica em detalhes o funcionamento do seu produto ou serviço, mas também pode ajudar o cliente a estruturar seu desafio de negócio, a compreender problemas internos da sua empresa e até avaliar proposta de concorrentes.
A literatura de vendas e de negócios em geral fala muito sobre a importância da venda consultiva. No entanto, nota-se uma escassa discussão sobre os cuidados que se deve ter ao se praticar a tão famosa abordagem consultiva em vendas, embora seja um problema frequente de quem a pratica encontrar uma medida certa de até onde ir com a consultoria.
A declaração ano passado do Rodrigo Galindo, CEO do maior grupo de educação superior do Brasil, a Kroton, causou polêmica e traz mais insumos para essa discussão. Na ocasião Rodrigo Galindo afirmou que na época em que o seu grupo educacional não possuía dinheiro, eles realizavam processos seletivos de consultorias, ouvia as melhores ideias e não contratavam nenhuma.
A afirmação gerou polêmica, revolta e um pedido de desculpas de Rodrigo Galindo, que depois tentou explicar o que já estava explicado. A declaração do principal executivo do mercado de educação do Brasil traz o desafio de quem vende conhecimento: como vender o peixe sem entregar o peixe?
A venda de conhecimento como produto final ou ainda a venda respaldada por um olhar consultivo sempre vai incorrer nesse risco do vendedor apresentar seu conceito e o cliente pegar a sua ideia e executa-la internamente ou ainda passá-la para um fornecedor mais barato.
Para citar uma experiência pessoal, apenas ao longo de 2017 lembro de ao menos cinco potenciais clientes que possuíam demandas de digital muito pouco estruturadas, ou seja, tinham problemas em suas empresas relacionados à estratégia digital, mas não sabiam exatamente qual era o problema e muito menos como solucioná-lo. Em meu processo de venda ajudei estes clientes a definirem claramente suas dores e estruturar um plano de trabalho como solução.
Com minha proposta em mãos, estes potenciais clientes pegaram meu material e levaram para o mercado para fazer a clássica cotação de 3 propostas. Não fechei nenhum negócio. Qual foi o aprendizado dessas situações?
Em primeiro lugar, esse risco sempre vai existir para quem vende conhecimento ou ainda realiza vendas consultivas. O segundo aprendizado é ter um pouco mais de controle sobre o que você entrega em uma proposta. Sua proposta não pode ser um edital de concorrência! Trata-se de uma tarefa difícil para quem vende conhecimento não entregar muito o jogo, mas é possível mudar esse cenário se você exercitar os conceitos que passo a seguir.
Ao fazer uma proposta consultiva, procure vender a transformação, ou seja, mostre claramente o ponto A do cliente, ou seja, sua situação atual e enfatize, na sequência, o ponto B, ou seja, onde você vai leva-lo. Isso é vender transformação! O que será feito para deixa-lo em outro patamar é o seu segredo como vendedor consultivo e deve ser pouco revelado nessa proposta.
Essa estratégia pode mitigar significativamente o risco da venda do seu conhecimento, mas ela não é 100% efetiva. Existem clientes que vão querer aprofundar a discussão para fechar negócio contigo e vão exigir você contar o “como fazer”. Nesse tipo de situação, uma saída é apresentar algum case semelhante, caso possua, sem mostrar exatamente o plano para esse cliente específico. Se ainda assim precisar apresentar o “como” deste cliente, evite escreve-lo na proposta. Procure falar verbalmente.
Além de se proteger na forma que você entrega seu conhecimento em uma proposta, outra questão crucial nesse processo de venda é ter o radar muito apurado para detectar falsas concorrências que são elaboradas com o objetivo de sugar conhecimento gratuito do mercado, como no suposto caso da Kroton. Trata-se da situação mais danosa para quem vende conhecimento.
Neste caso, cabe ao executivo de novos negócios avaliar a consistência dessa concorrência. Questionamentos sobre quem está participando do processo além da sua empresa, budget para o projeto, avaliação da pessoa que está demandando o serviço e até análise se essa empresa possui histórico prévio no mercado de contratar esse tipo de serviço ajudam na avaliação da veracidade da concorrência. Se após essas análises ainda persistirem dúvidas, não participe do processo, não por entregar conhecimento gratuito ao mercado, mas para não perder seu precioso tempo comercial.
Realmente acredito que a maioria dos problemas da venda consultiva não estão relacionados à má fé dos contratantes. Ainda que este problema exista, ele é ínfimo no mercado. A grande questão é que os vendedores entregam demais no seu fluxo de vendas. Aprendi duas coisas com esse processo de vendas consultivas: 1) Venda a transformação, ou seja, busque outros argumentos de vendas que não seja a estratégia de levar o cliente do ponto A ou B. Marque bem esses dois pontos, mas não conte como você vai fazer essa transição. 2) O segredo está na execução e não na ideia. Clientes que buscam migalhas de conhecimento presentes em propostas são clientes ruins, normalmente orientados a preços e não a valor. Você realmente quer esse tipo de cliente? Foque em seu negócio: mais do que vender boas ideias, execute com maestria ideias geniais. Bons clientes pagarão muito bem por esse binômio!