A palavra “Não” carrega em sua essência uma proibição, um desalinhamento ou ainda uma quebra de expectativa. Justamente por possuir uma carga negativa, é da natureza humana evitar situações em que o “Não” é proferido. Tanto de quem diz o “Não”, quanto de quem o ouve, evita-lo traz certo conforto social, embora na maioria das vezes escutá-lo é muito mais produtivo e engrandecedor para os indivíduos. Quer conhecer uma situação em que escutar o “Não” logo é a melhor coisa? Em vendas!
Quem trabalha com vendas e desenvolvimento de novos negócios está o tempo todo buscando encontrar compradores para os seus produtos e serviços. Existe um gasto imenso de energia na procura de um potencial cliente. Este investimento pode ser muito maior no desenvolvimento de relações com esses eventuais compradores. O vendedor faz uma aposta de que essa potencial relação possa gerar uma venda. Alguns contatos podem comprar, outros não. Isso faz parte de um processo natural de vendas.
Ocorre que muitos compradores, após conhecer uma solução, tirar dúvidas, realizar algumas reuniões, pedir proposta e negociar, podem decidir não comprar. O motivo dessa recusa pode ser o mais variável: um concorrente pode oferecer uma proposta melhor, o comprador pode decidir comprar depois ou estar ocupado com outro assunto mais importante. A questão é que o comprador pode simplesmente não querer comprar e os motivos para isso são infinitos. Neste caso, é preciso dizer que ele não irá comprar agora ou nunca. É aí que entra a “cultura de compras” do brasileiro, que evita ao máximo dizer “Não”.
Talvez a sociologia possa explicar melhor, mas fato é que povo brasileiro é amistoso e acolhedor, o que traz uma série de benefícios para a nossa cultura. Por outro lado, esse comportamento cortês de nossa gente traz muita distorção e ineficiência para um processo comercial, pois o comprador brasileiro possui terror em dizer que não irá fechar negócio com você, o que demonstra pouco profissionalismo do lado comprador e exige uma habilidade grande da parte do vendedor em identificar essas situações.
Essa dificuldade do comprador brasileiro em dizer “Não” produz também algumas situações inusitadas e cômicas. Recentemente estava em conversas com um potencial cliente, que precisava de uma agência de marketing para desenvolver um aplicativo mobile. Neste exemplo nem vou focar na pouca experiência que esse comprador possuía para desenvolver um sistema tecnológico daquela magnitude e sim nas suas habilidades negociais. Esse potencial cliente ficou cerca de 40 dias em alto contato comigo. Foram algumas reuniões, uma dezena de ligações e conferências telefônicas com sócios do projeto. Quando o processo comercial foi caminhando para o fechamento, notei que até pela inexperiência do comprador, ele iria decidir por uma solução mais barata, sem grande apreço pelo o que seria entregue. Quando chegou a hora desse comprador dizer “Não”, ele foi um brasileiro médio. Simplesmente fugiu.
Primeiro passou a não responder e-mails. Depois não atendeu ligações. Chegou um momento que observei que ele tinha seguido outro caminho comercial, o que é natural. Em meu follow-up final deixei claro que estava à disposição para uma retomada das conversas caso ele desejasse. No entanto, o mais hilário estava por vir: dias depois, em um evento específico, o encontro no meio do coffee break. Quando ele me viu, buscou mudar de posição no salão. Até que quando fui retornar ao auditório, o encontro na porta. Parei e cumprimentei-o, e deixei o silêncio como pano de fundo de nossa conversa. Esse comprador ficou desesperado, inclusive ensaiou um “qual é o seu nome mesmo?”. Ele simplesmente fingiu que não me conhecia apenas porque ele não soube dizer um “Não” dias antes. Nem os seus cabelos grisalhos o impediram de protagonizar essa cena pouco profissional.
Desse episódio, fica claro o quanto o brasileiro possui pouca habilidade em dizer “Não”. O curioso que esse receio traz uma certa contradição. Em muitos momentos, o “Não” é evitado para preservar a relação. Contudo, quando esse “Não” é postergado a todo custo acaba colocando a relação pessoal em cheque, com atitudes pouco profissionais. O que esse tipo de comprador esquece é que ninguém é obrigado a fechar um negócio. Se o vendedor que lhe atendeu foi profissional, ele vai entender o seu “Não” e mais, ele almeja ouvir um “Não” ou um “Sim”, ou seja, respostas bem objetivas e sinceras. Lembre-se que a pior resposta para um vendedor não é “Não” e sim um “Talvez” ou “Estou vendo” ou ainda “Estou pensando”.
Economistas apontam que o brasileiro produz, em média, 20% do trabalhador norte americano, ou seja, é preciso cinco trabalhadores brasileiros para fazer o que um trabalhador faz nos Estados Unidos. Grande parte dessa baixa produtividade está atrelada a questões de formação de mão-de-obra, o que é pouco discutível. No entanto, acredito também que exista uma componente cultural, como no caso da temática relatada neste texto. Trabalhadores com boa formação carregam a ineficiência em seu DNA, quando evitam dizer um simples “Não” em um processo comercial. São reuniões que ocorrem que não precisariam existir, ligações que são feitas e que não geram retorno ou ainda muita postergação de algo que já foi decidido, mas não dito. Portanto, se você trabalha com vendas saiba que a sua produtividade depende de alguém não muito produtivo do outro lado. Ou você se prepara para esse cenário, ou alguém pouco preparado do outro lado vai afetar os seus resultados.